domingo, 11 de julho de 2010

Um instante de prata


O sol surgirá em breve e com ele, eu acabarei a minha noite. Pousarei o lápis e depois de um trago de café, sairei para o trabalho, carregada de saudades, farta de sono. A minha face encher-se-á de olheiras mas eu nada me importarei. Pois sei que, bem lá no fundo, da noite escura e vaga, trarei um bebé no ventre. E esse reduto me bastará! As minhas ovelhas balem incessantemente ante a pureza da manhã. Toda eu serei um impulso eléctrico. De tarde, encostada a uma parede branca muito alta, deverei dormir por uns instantes. Dormirei com um olho à cautela e uma mão liberta presa à máquina, de um momento para o outro o instante chama-la-á.
Pensa Clara que nunca se construirá uma lente que fotografe igualzinho ao que o olho vê…

Nuno Monteiro

1 comentário:

Dina Cruz disse...

Nunca uma lente conseguirá ver com a alma... A lente simplesmente olha!
O belo e o horrendo só existem quando queremos vê-los... Quando a alma nos deixa vê-los. Tudo o mais é só olhar sem ver...

“ A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.”

António Lobo Antunes

Prémio Histórico - Filosóficas

Arquivo do blogue