domingo, 4 de julho de 2010

Invocação


As nuvens viajavam lá pelo alto, longe, tão distantes dela. Marulhavam no mar imenso da eternidade. Putas! Nuvens que não envelhecem. Talvez essas nuvens sejam, tanto ou tão pouco, o que em mim nasceu errado… não sei mais. Não vejo nem aclaro mais que o céu imenso, azul, distante, frio. Em direcção ao vazio. Um calabouço. Um calabouço de velhice. Peço, então, em consequência, aos anjos e santos, que me destituam de razão. Ou que me instilem veneno, maldito, intravenoso. Acordarei para a noite, depois. Vender-me-ei ao diabólico satã. E de dia, enquanto a invernia adoça os amantes ou os cheira a mar, eu, no meu imenso e glorioso vazio, prescindirei de tudo, até de ti, pássaro, que te idolatras por detrás do sol.
(Clara, enquanto subia a avenida, deixando para trás o eco do mundo)

Nuno Monteiro

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“ A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.”

António Lobo Antunes

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