terça-feira, 7 de outubro de 2008

A Lisboa da minha infância


Sonho e poesia, baladas e cafés
Tão breves linhas etéreas
Do nada se tenta dizer tudo e eu só, contigo e com a chuva
Soluto, surpreso, eu canto, eu sou apenas eu

Um único gorgulho, inseguro, inglório, sorrateiro
Gotinha de chuva, bairro da Madragoa
Ao fundo o triste fado e eu dissolvido nesses langores
Perdido olhando o Tejo e hesitando soletrando ameaças

Ao vento e aos gárgulas que com asas de anjo
São estupro, fraude e infâmia
Um só canto, uma só arma, a minha pequenina praça
A minha cantiga e este texto que é também teu

Sai, amiga desconhecida, sai e avança caminhando
Seremos chuva que nos dissolvamos
Marcaremos as pedras os ferros e a bandeira
Corrijamos o rumo desta nossa tão triste barcaça.

Peço apenas mais um pouco de atenção e
teus olhos escuros me mirando
tua pele tisnada rindo contente ante o palhaço que jaz em mim
teus cabelos negros apanhados figura mãe de uma nova nação

Terás que ser tu, pequena lisboeta, alvoroçando bandeiras e atiçando faúlhas
Tu e a minha angústia numa luta incessante por todos os pobres
Todos os abandonos
Sempre imersos em insónia
Por isso poesia, ténues linhas contra toda uma armada
A figura da mãe, a figura estarrecida, a mulher ardina, tão cansada e assustada
Ao fim da estrada parando e sonhando, sonho e fogo, alma e revolução.

Nuno Monteiro

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“ A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.”

António Lobo Antunes

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