segunda-feira, 21 de junho de 2010

Vrummmmm...

Vrummmm…

Clara! Serás capaz de me dizer, porque te cansas a escrever, quando te podias divertir, olhando as flores e os campos distantes, conversando de par em par sobre os mais diversos assuntos, sobre a lentidão da vida, sobre o sol e as praias, enfim… Clara distraída, olha por cima do computador, e indecisa, remete-se ao silêncio. Então ele volta à carga… Por que definhas Clara, nesse enorme pranto do qual não pareces conseguir sair. E de novo ela, distraída, tacteia o ar em busca de uma palavra, uma frase, algo que a sustente. Durante um pequenino tempo longo, entre eles, o ar parado, uma espiral de fumo, as olheiras na cara dela, na cara de Clara… e quando ele perdia as esperanças de se ver respondido… eis que Clara se manifesta, apenas para delirar!
Pirilampo ou borboleta! Quem acompanhará Ulisses, o meu Ulisses. Quem?
E ele, pernas inchadas na banheira, água espuma que lhe cobria os mamilos, grita! Vruuuuuummmmmmm enquanto acompanha o movimento com a mão direita… uma lâmina de água esvoaça da banheira e espalha pelo chão de pedra… não tens ninguém no mundo para ler essas tuas merdas…
E de súbito, Clara, esquecendo que está de pijama e de pés descalços, abandona a escrita e sai para o passeio. Um estrondo da porta enche o interior da casa. E logo após, um imenso silêncio.

Nuno Monteiro

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“ A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.”

António Lobo Antunes

Prémio Histórico - Filosóficas