(Aqui fica transcrito e registado na íntegra a conversa que a menina teve com o estado)
Menina: Como é facilmente visível falta-me grande parte da face esquerda! Foi um garoto de rua que eu tentava encantar… enfim! Ninguém me dá emprego! Não tenho qualquer fonte de rendimento…
Estado: e então que pretende?
Menina: pelo menos um cirurgião que me devolva aos poucos a minha antiga face…
Estado: e que garantias tem que todos esses tecidos em falta são substituíveis?
Menina: “…?????????????...!!!!!!!!!!!” entorna o cabelo preto sobre a face esquerda para não se expor tanto.
Estado: deve preencher primeiro este impresso! Título do papel: Registo de autorização para consulta médica de especialidade. Terá então que o fazer acompanhar de um comprovativo de emprego…
Menina: (interrompendo) Mas se eu não consigo emprego!
Estado: Se não se encontra empregada não tem direito a estado!
Menina: Como podem as regras excluir-me…
Estado: (interrompendo) muito simples se a menina não trabalha não desconta e se não paga ao estado o estado não pode pagar ao cirurgião. E voltando à carga: O estado antevê – pelo seu aspecto e figura – uma condição clínica complicada! E uma reabilitação complicada e morosa. Logo dispendiosa. Não é o género de serviço que se faça de borla.
Menina: então e poderia o estado ao menos providenciar-me um lugar na administração pública? Assim já poderia pagar pelas minhas operações…
Neste preciso instante batem as cinco horas! O estado entrega uma ficha com um número à menina
e
Queira desculpar. Acabou a minha hora de expediente. Reabriremos a repartição amanhã às nove horas. Passar bem…
A menina fica desamparada e de novo na face da rua. E é então que se apercebe que toda a rua está polvilhada de buracos. Toda aquela rua é um gigantesco estaleiro de pobres e pedintes. Toda a rua é um alter-ego seu. Só nessa altura percebeu o que deveria fazer…
Dez da noite. Toda a rua dorme ou serenamente se prepara para deitar. Os candeeiros só agora acendem. À medida que cai a escuridão! As aves recolhem-se e dormem. Não há sinal de libertação. Da minha rua eu não vejo senão a candeia que menos alumia. Da minha rua eu te não vejo a ti. Da minha rua. Só o instante seguinte. Só o vento, nem o vento. Da minha rua.
Menina: Como é facilmente visível falta-me grande parte da face esquerda! Foi um garoto de rua que eu tentava encantar… enfim! Ninguém me dá emprego! Não tenho qualquer fonte de rendimento…
Estado: e então que pretende?
Menina: pelo menos um cirurgião que me devolva aos poucos a minha antiga face…
Estado: e que garantias tem que todos esses tecidos em falta são substituíveis?
Menina: “…?????????????...!!!!!!!!!!!” entorna o cabelo preto sobre a face esquerda para não se expor tanto.
Estado: deve preencher primeiro este impresso! Título do papel: Registo de autorização para consulta médica de especialidade. Terá então que o fazer acompanhar de um comprovativo de emprego…
Menina: (interrompendo) Mas se eu não consigo emprego!
Estado: Se não se encontra empregada não tem direito a estado!
Menina: Como podem as regras excluir-me…
Estado: (interrompendo) muito simples se a menina não trabalha não desconta e se não paga ao estado o estado não pode pagar ao cirurgião. E voltando à carga: O estado antevê – pelo seu aspecto e figura – uma condição clínica complicada! E uma reabilitação complicada e morosa. Logo dispendiosa. Não é o género de serviço que se faça de borla.
Menina: então e poderia o estado ao menos providenciar-me um lugar na administração pública? Assim já poderia pagar pelas minhas operações…
Neste preciso instante batem as cinco horas! O estado entrega uma ficha com um número à menina
e
Queira desculpar. Acabou a minha hora de expediente. Reabriremos a repartição amanhã às nove horas. Passar bem…
A menina fica desamparada e de novo na face da rua. E é então que se apercebe que toda a rua está polvilhada de buracos. Toda aquela rua é um gigantesco estaleiro de pobres e pedintes. Toda a rua é um alter-ego seu. Só nessa altura percebeu o que deveria fazer…
Dez da noite. Toda a rua dorme ou serenamente se prepara para deitar. Os candeeiros só agora acendem. À medida que cai a escuridão! As aves recolhem-se e dormem. Não há sinal de libertação. Da minha rua eu não vejo senão a candeia que menos alumia. Da minha rua eu te não vejo a ti. Da minha rua. Só o instante seguinte. Só o vento, nem o vento. Da minha rua.
Nuno Monteiro
Foto. The paradise we made. Rui V.
Sem comentários:
Enviar um comentário